Se o meu walkman falasse

Ele diria as incontaveis vezes que perdi a hora pra trabalhar/estudar pq ficava num transe escutando musicas…

Ele contaria as vezes que caminhei, sem dinheiro pro ônibus, da minha casa até a casa de um grande amigo. E ele ainda diria como eu contava o tempo por músicas… 3 musicas em média até o shopping, 5 músicas mais ou menos até a Vila… 4 músicas até a USP… duas fitas inteiras até Taubaté.

Ele ia falar dos amores rápidos, do romance instantâneo que era compartilhar o mesmo fone de ouvido…

O sexo casual, ao som de uma rádio qualquer, que não pegava direito…

Ele lembraria da música que estava escutando quando descobri que amar doia demais…

E me aconselharia a nunca mais mentir pra mim mesmo, nas noites tristes que usava ele como psicologo e amigo…

Certamente ele ia dar risada quando lembrasse que eu classificava minhas fitas em “Noites chuvosas”, “dias ensolarados”, “manhãs nubladas”, “Fim de tarde laranja” e “Bg de uma vida”.

Ia chorar comigo no dia que inventaram o MP3 player, e ele se viu quase extinto…

A raiva de escutar a mesma fita durante duas horas (de onibus) até a rodoviária numa sexta feira engarrafada.

Dos dias no Sebo do Messias talvez ele não lembre, mas nisso eu ajudo a se recordar.

Dos museus, só nós dois.

E quando todo mundo parou de vender fitas K7, e eu fiquei frustado. E das escolhas difíceis, quais fitas podem ser reaproveitadas?

Da preguiça de gravar uma fita inteira, e ter várias pela metade, sobrepostas, com musicas pela metade…

Ele vai lembrar quando eu estive deprimido, totalmente drogado e olhando seriamente para uma janela vazia, esperando um amor inexistente, mas ele estava pronto, tinha a musica perfeita para quando acontecesse…

E na livraria? horas de leitura ao som dos mais variados artistas…

Se ele falasse, certamente seria em inglês…

A expectativa da próxima música, ou da música no fim da fita, sem poder avançar pq o botão tinha emperrado…

Quando ele foi aberto, tanto para arrumar, ou esconder “coisinhas” proibidas…

Do dia em que escutei a noticias mais assustadora do inicio do século, o fim do mundo, foi ele quem me avisou…

Da alegria de chegar em São Paulo, ainda no onibus, e sintonizar a rádio Rock, que ainda era rock, e futuramente, a rádio Kiss FM…

Os desejos secretos, e das musicas especificas, das coincidencias, e do momento exato para agir.

Pores do sol roxos da poluição, vistos do alto de um prédio, no terraço, enquanto desejava voar, ou voava com a ajuda de alucinógenos.

Da engenhoca para gravar direto do MP3 do computador, enquanto todos me falavam “compra um toca MP3, ou discman”. Não

Quando ele foi roubado, corri atrás do ladrão, ele o jogou no chão, estava mais interessado na minha carteira e celular.

Das inumeras vezes que me perdi, na minha mente, ele me mostrou o caminho, pela musica, de volta.

Das aulas de bateria, e dos acompanhamentos… da monotonia de uma fita inteira gravada com “tics tics tics” do metronomo…

Quando foi repaginado ele reclamou um pouco, mas aceitou, novas cores, nova vida.

E do dia que finalmente me rendi ao mp3, mas nunca o esqueci…

Agora ele vai ser seu, cuida dele como cuida de mim?

1 comentários:

Paula Miné disse...

linda historia de amor...

sim, cuido dele como cuido de você, ou como você cuida de mim da na mesma...

quero caminhar por são paulo dividindo fone com você... vendo coisas que você viveu e escutar milhares de historias de vocês dois...

e pra terminar... um simples.. te amo.. que pra mim é mais que especial... pq você é unico.. e especial

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TNB